Não é verdade que uma pesquisa aponte a hidroxicloroquina como o tratamento mais eficaz para a Covid-19, como afirmou a Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República) nesta quinta-feira (21) em um tweet (veja aqui), que posteriormente foi apagado. A fonte da informação citada é, na realidade, uma enquete sem validade estatística feita pelo fórum online Sermo. Mesmo que fosse representativa dos médicos do mundo, a enquete mede apenas a percepção desses profissionais de saúde sobre tratamentos não seria suficiente para atestar a eficácia de uma droga porque isso só pode ser feito após testes clínicos do medicamento.
Além disso, a Secom ainda usou dados desatualizados da enquete da Sermo. Em levantamento realizado em março e divulgado em 2 de abril, o fórum exibia a hidroxicloroquina como o tratamento que mais médicos (37%) consideravam “muito eficiente”. Porém, nos dados mais recentes, de maio, a parcela de profissionais que considera a hidroxicloroquina muito eficaz caiu para 23%.
Desinformação sobre cloroquina gerada a partir das enquetes da Sermo já circularam no Reino Unido, onde foram checados pela agência Full Fact. Aqui no Brasil, a alegação falsa da Secom foi reproduzida em uma série de perfis pessoais e páginas nas redes sociais. No Facebook, o conteúdo enganoso reunia ao menos 3.000 compartilhamentos na noite desta quinta-feira (21). Todas as postagens foram marcadas com o selo FALSO na ferramenta de verificação da rede social (saiba como funciona).
A hidroxicloroquina é o tratamento mais eficaz contra o coronavírus atualmente disponível. A informação foi levantada por uma pesquisa internacional feita com mais de 6 mil médicos, de 30 países.
Em tweet publicado nesta quinta-feira (21) e posteriormente apagado, a Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República) afirma que a hidroxicloroquina é o tratamento mais eficaz atualmente no combate à Covid-19 e cita, como fonte da alegação, a Sermo, um fórum que faz enquetes com médicos sobre medidas e terapias adotadas contra o novo coronavírus. Porém, essa sondagem não serve para atestar a eficácia da droga contra a doença, pois se baseia apenas nas percepções de um número limitado de médicos, não em estudos clínicos feitos com pacientes.
As enquetes da Sermo medem a opinião dos médicos sobre a eficácia de medicamentos e terapias usados para tratar pacientes com o novo coronavírus. O fórum não analisa dados clínicos, como taxa de recuperação e mortalidade de pacientes tratados, nem compara essas informações com grupos que não usaram os tratamentos, como acontece em estudos clínicos que avaliam a eficácia de medicamentos.
Além disso, apesar de entrevistar milhares de profissionais de 30 países diferentes, como explica em sua metodologia, a amostra da Sermo não é representativa da população de médicos desses países. Isso significa que os resultados do levantamento não podem ser generalizados para indicar a opinião de todos os médicos. Segundo a Sermo, os dados atuais mostram que tratamentos com plasma são percebidos com
A alegação do post da Secom é enganosa ainda por se basear em dados desatualizados, de um levantamento de realizado em março e divulgado no dia 2 de abril. Naquele mês, a Sermo fez uma série de perguntas a 6.200 médicos de 30 países sobre a situação da pandemia e tratamentos contra a infecção. A hidroxicloroquina na época era percebida por 37% dos médicos entrevistados como uma droga “muito eficiente”, tratamento melhor avaliado entre os 15 listados.
No último levantamento da Sermo, divulgado nesta quinta-feira (21), a hidroxicloroquina havia perdido popularidade: foi considerada muito eficaz por 23% dos 4.756 médicos entrevistados entre 11 e 13 de maio. Os tratamento mais bem avaliados são os que usam plasma de pacientes recuperados do novo coronavírus e gama globulina, os únicos avaliados como muito eficientes por mais de 50% dos médicos.
É importante ressaltar que os resultados da enquete publicada pela Sermo refletem a opinião e as experiências dos médicos participantes, e não incluem dados clínicos. Por isso, quaisquer resultados divulgados nele não permitiriam atestar a eficácia de uma terapia sobre outras.
Pesquisas. Até o momento não existe tratamento específico nem vacina para a Covid-19, segundo a OMS. Há, no entanto, em andamento centenas de pesquisas para o desenvolvimento de vacinas e para o uso de antivirais e outros tipos de medicamentos de outras doenças no combate ao novo coronavírus.
Os dois maiores e mais recentes estudos sobre hidroxicloroquina, feitos com mais de mil pacientes cada e publicados em periódicos importantes, não encontraram evidências de que a medicação ajude no tratamento de Covid-19.
O primeiro, publicado em 7 de maio no The New England Journal of Medicine, analisou dados de 1.446 pacientes internados em Nova York, dos quais 811 receberam tratamento com cloroquina, e concluiu que “não houve associação significativa entre o uso de hidroxicloroquina e [a taxa de] intubação ou morte”.
Outro, publicado no dia 11 de maio no Jama, comparou informações de 1.438 pessoas hospitalizadas (também em Nova York) e chegou à mesma conclusão, de que “tratamento com hidroxicloroquina, azitromicina ou ambos não estiveram associados a redução significativa da mortalidade”.
Uma terceira pesquisa, esta randomizada e com 150 pacientes, foi ainda publicada no The British Medical Journal e tampouco encontrou efeitos significativos da droga no tratamento da Covid-19.
A hidroxicloroquina se tornou um dos medicamentos mais estudados do mundo depois que pesquisas preliminares apontaram que ela agiria contra o novo coronavírus. Pesquisadores da China, por exemplo, realizaram testes in vitro (que são feitos em culturas de células em em laboratório) em março. Esses ensaios pré-clínicos, que são uma das etapas iniciais para avaliar a eficácia de um medicamento contra uma doença, mostraram o potencial da hidroxicloroquina em inibir o novo coronavírus.
Um estudo clínico aberto e não randomizado na França mostrou resultados promissores do uso da droga em pacientes com Covid-19 e aumentou o apoio à hidroxicloroquina. Com uma amostra pequena e vários problemas metodológicos, o estudo foi criticado até mesmo pela revista que o publicou, a IJAA (International Journal of Antimicrobial Agents).
Referências:
1. Twitter
4. Bloomberg
5. The New England Journal of Medicine
6. Jama
7. The British Medical Journal
8. IDSA