Circula nas redes sociais que a Organização Mundial de Saúde (OMS) admitiu que o alto número de falsos positivos dos testes de PCR para Covid-19 criaram uma “falsa” pandemia. Segundo o texto da publicação, existe um “teste manipulado” que cria resultados positivos que não existem. Por meio do projeto de verificação de notícias, usuários do Facebook solicitaram que esse material fosse analisado. Confira a seguir o trabalho de verificação da Lupa:
“OMS admite que alto número de falsos positivos dos testes de PCR criaram uma falsa pandemia”
Título de texto publicado pelo site Stylo Urbano que, até as 13h de 27 de janeiro de 2021, tinha sido compartilhado mais de 500 vezes
A informação analisada pela Lupa é falsa. Não há, por parte da Organização Mundial da Saúde (OMS), nenhuma afirmação que um alto número de falsos positivos de testes de PCR “criaram uma falsa pandemia”. Em 20 de janeiro, a instituição publicou um documento que recomenda técnicos de laboratório a seguir precisamente as instruções do fabricante ao manusear testes PCR, usados na detecção do novo coronavírus.
A organização lembra, também, que a redução na prevalência da doença aumenta a probabilidade de falsos positivos, e que é recomendado avaliar outras variáveis, como a existência de sintomas ou o contato prévio do paciente com pessoas infectadas, antes de diagnosticar alguém a partir do resultado do teste. Em nenhum momento o documento diz que os testes PCR não devem ser realizados, que são imprecisos, ou que eles criaram uma “falsa pandemia”.
À agência Politifact, dos Estados Unidos, o virologista Ben Neuman, da Texas A&M University-Texarkana, explica que os testes de PCR funcionam duplicando o material genético em ciclos até que os traços do vírus se tornem mais facilmente detectáveis. Se houver uma grande presença de vírus na amostra, menos ciclos serão necessários para detectá-lo, diz. A quantidade de ciclos necessária para determinar se um paciente é positivo varia entre os diferentes tipos de testes.
É por isso que o aviso da OMS alerta os técnicos de laboratório a verem resultados de teste positivos fracos (aqueles com limiares de ciclo alto) com cuidado e consultar as instruções em seu equipamento de PCR antes de emitir resultados de teste positivos ou negativos.
O documento da OMS explica que a prevalência da doença altera os valores preditivos dos resultados dos testes; se a prevalência da doença diminui, o risco de dar falso positivo (resultado positivo em uma pessoa não-infectada pelo vírus) aumenta. “Isso significa que a probabilidade de que uma pessoa com resultado positivo (SARS-CoV-2 detectado) esteja realmente infectada com SARS-CoV-2 diminui à medida que a prevalência diminui, independentemente da especificidade alegada”, explica a OMS. Ou seja, se a densidade do vírus em circulação é baixa, a detecção pelo teste torna-se mais exigente do ponto de vista técnico.
O professor Mateus Westin, do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG, explicou por e-mail que todo teste diagnóstico tem seus atributos de precisão e os consequentes e inerentes riscos de resultados falso positivo e falso negativo. No caso do teste de PCR para diagnóstico de Covid-19, a probabilidade pré-teste está atrelada ao contexto epidemiológico da localidade, além de eventuais sintomas sugestivos de infecção pelo novo coronavírus. “Se por exemplo a pessoa está num local de baixa prevalência/transmissão, e teve pouca exposição de risco e não tem sintomas, um resultado do teste positivo tem uma certa chance de ser falso-positivo e vice-versa”, diz.
É importante explicar que a precisão de um teste depende de dois fatores, a sensibilidade e a especificidade. Sensibilidade é a capacidade de um teste em identificar, dentre as pessoas com suspeita da doença, àquelas realmente doentes. Ou seja, é a probabilidade de um teste dar positivo na presença da doença. Por outro lado, a especificidade dos testes se refere à proporção de dar negativo naqueles que não estão com a doença. Quanto maior a precisão do exame, maior a chance de seus resultados mostrarem a realidade.
A maioria dos ensaios de PCR é indicada como auxílio para o diagnóstico, portanto, os profissionais de saúde devem considerar qualquer resultado em combinação com o momento da amostragem, tipo de amostra, dados específicos do ensaio, observações clínicas, histórico do paciente, informa a OMS no documento. A entidade reafirma que os testes de diagnóstico de PCR são altamente precisos e devem ser realizados em laboratório.
A Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (SBAC) explica que o teste PCR avalia a presença de RNA viral na amostra. Um único resultado não detectado com RT-PCR para SARS-CoV-2 não exclui o diagnóstico da Covid-19, diz. Vários fatores como coleta inadequada da amostra, tipo de amostra biológica, tempo decorrido entre a coleta e o início dos sintomas, e oscilação da carga viral podem influenciar o resultado do exame. “Sempre que houver discordância com o quadro clínico epidemiológico, o exame de RT-PCR deve ser repetido em outra amostra do trato respiratório”.
O pesquisador Zilton Vasconcelos, do Laboratório de Alta Complexidade do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), afirma, por exemplo, que o teste molecular deve ser realizado entre o terceiro e sétimo dia de sintomas para aumentar a chance de detecção do RNA viral. “Um teste negativo não descarta a infecção, apenas indica que naquele momento sua carga viral é indetectável”, diz
Checagem similar foi feita por AFP Checamos e Polígrafo, em Portugal.
Nota: esta reportagem faz parte do projeto de verificação de notícias no Facebook. Dúvidas sobre o projeto? Entre em contato direto com o Facebook.